quinta-feira, 21 de junho de 2012


De TIMOR

Caríssimos amigos, familiares e irmãs


Estou na recta final da minha estadia em Timor Leste antes de voltar a Portugal no próximo mês de Julho, o tempo foi um flash que disparou ao longo destes meses, foram de facto centelhas de vivências em que o que recebi não caberá num espaço infinito e que perdurará para além desse mesmo infinito, explicar-vos este sentimento interior seria “estrangulá-lo” na sua essência. Mas tenho a certeza de que compreenderão, não na totalidade mas pelo menos pelo sentido que estas experiências têm na vida de muitos e de muitas que dão a vida, o tempo e tudo o que isso implica, afinal eu sou apenas uma gota nesse imenso oceano de pessoas que ao longo de gerações e gerações fazem estes trajectos longe da sua pátria e da sua “normal” rotina de vida, basta nos deslocarmos uns kms e encontramos sempre alguém que está em situação semelhante e que com um amável e simpático interesse nos pergunta quem somos e donde vimos.
Depois do mês de Maio cheio de celebrações em Díli, preparámo-nos para outro acontecimento com especial importância: a visita da Superiora Geral à missão.
No dia 7 de Junho pelas 14.10 (hora local) dia do Corpo de Deus, chegou então a Superiora Geral, ir. Ana Paula e com a ela a ir. Maria de Lurdes que ficará na missão. Penso e tenho a certeza de que este momento da chegada tocou a cada uma e cada uma viveu dentro de si com forte emoção este reencontro comum entre as irmãs, Nós que estamos aqui longe de Portugal e de todos, as duas que chegavam ao desconhecido Timor Leste.
Apesar do cansaço próprio da viagem e do intenso calor que se faz aqui, ainda participámos na chegada da procissão do Corpo de Deus em DÍLI cuja multidão de crentes sempre nos impressiona, e naquele histórico largo de Lecidere junto ao mar, com a imponente Imagem de Nossa Senhora da Conceição, fazia-nos sentir num ambiente místico ao qual nenhuma de nós ficou indiferente.
No dia seguinte depois de uma visita de manhã bem cedo ao Sr. Embaixador de Portugal, a seu convite na sua residência, fizemos a viagem até Memo – Maliana onde nos esperava um grande grupo de crianças e adolescentes que fizeram a honra da comunidade e expressaram com canções e sorrisos a alegria de receber as duas novas irmãs na missão.
Depois deste primeiro momento de acolhimento, outros se seguiram nos dias seguintes, em Maliana com o Sr. Bispo D. Norberto do Amaral que nos aguardava com um natural sorriso, nas irmãs canossianas, cuja gentileza é sempre profundamente expressa pela nossa Madre Rosa que convoca a sua multidão de crianças que a rodeiam e animadas cantam maravilhosamente e, no domingo de forma surpreendente uma belíssima recepção aqui em Memo pela comunidade local que expressou com as suas danças tradicionais e na presença do Pe. Hipólito a sua satisfação pela presença da Superiora Geral e da ir. Maria de Lurdes. Durante a Celebração o Pe. Hipólito valorizou a presença da comunidade religiosa portuguesa e propôs à Superiora Geral para dar uma palavra a toda a comunidade de Memo, o que nos comoveu muito.
Esta primeira semana ficou centrada em visitas à missão e todo o espaço geográfico da missão em si: a futura residência e o seu local, a obra social que será para desenvolver, a avaliação dos projectos que entretanto foram elaborados e aguardavam a sua avaliação, as visitas às entidades locais, Instituições, como a Escola Portuguesa e a Festa da diocese. Na segunda semana foi marcada com uma histórica visita ao Oecússi, à comunidade das irmãs da Divina Providência, a região de Timor em enclave no território da Indonésia. Apesar de ter sido uma longa viagem e a sujeição de passar em quatro fronteiras, duas entradas e duas saídas na Indonésia e em Timor simultaneamente, o acolhimento e a alegria daquela comunidade que nos recebeu nas pessoas da irmã Maria da Luz e da irmã Natália Ferreira superou a distância à mistura com o calor e o cansaço. Connosco, para nos ajudar nesta visita ao belíssimo desconhecido e histórico Oecússi, acompanhou-nos o Pe. Lazaro, verbita e sacerdote Indonésio, residente em Maliana, sem ele nunca teríamos chegado facilmente ao Oecússi, ele tinha lá sido pároco alguns anos, conhecia bem todo aquele território tão marcado pelos portugueses que fizeram a sua história com a chegada dos primeiros missionários a Timor em 1515 em Lifau – Oecússi, local bem definido junto ao mar e que tivemos o grandioso privilégio de também poder visitar nestes dois dias. A obra das irmãs do Oecússi é um hino de dávida aos timorenses desta região a quem elas incansavelmente dão a sua vida sem medida com alguns colaboradores timorenses e voluntários portugueses. Contam as histórias mais arrepiantes que se pode imaginar, vidas humanas que apenas carregam o seu corpo com pouca roupa e sem outra para a substituir, muitos sem casa digna ou sem nenhuma, outros ainda com a terrível lepra que quando são encontrados já estão em condições desumanas, e tantas histórias tristes e difíceis de digerir, ou como contava a irmã Maria da Luz lhes tira o sono e lhes faz cair as lagrimas convulsivamente mas que acabam por ser a fonte de amor destas irmãs e de tantos que direta ou de forma mais indireta se unem a elas para ajudar e ultrapassar tantos desafios alguns quase a parecerem intransponíveis.
 Esta obra tem também o seu lado mais inovador, na formação profissional de varias áreas desde cabeleireiro, informática, corte e costura e alfaiataria, muito interessante porque permite já a produção de serviços e rentabilidade dos mesmos utilizando os meios da obra das irmãs. Deus torna-se Esperança nesta obra do Oecússi. Impressionou-me muito o gosto que as irmãs expressaram com a nossa presença, em todos os momentos agradeciam e davam graças pela “histórica” visita, sentimento muito belo e muito fraterno!
Neste mês da visita da Superiora Geral, também tivemos as nossas privações, aliás continuamos, desde há mais de uma semana sem água canalizada. Todos os dias carregamos garrafões, garrafas de água vazias, baldes, e vamos buscar a água ao furo da comunidade, uma grande sorte porque este furo foi inaugurado há pouco menos de mês, senão não teríamos mesmo nenhuma água. Acabamos por compreender um pouco como é a vida real deste povo quando tomamos banho com as garrafas de agua, quando lavamos a roupa à mão com a agua dos garrafões ou cozinhamos com a agua dos baldes que com muito cuidado para que seja o mais limpa possível.
Enquanto vou escrevendo vai passando pela minha memória tantas pessoas, gestos, sorrisos, emoções que nos tocam e que até nos mudam para sempre. Como diria alguém, Timor é uma espécie de feiticeiro da alma e do coração, tem um feitiço que apaga em nós o que é difícil e motiva-nos para o que é grandioso. Se ao menos isso nos levar a sermos mais humanos, já terá valido a pena cada dia e cada momento nestas terras e com este povo.
Deixo-vos por agora, esta será com certeza a minha última história partilhada antes do regresso no próximo dia 3 de julho com chegada no dia 4 de julho pelo final da manhã.
Um abraço amigo e até breve…

Irmã Cristina Macrino




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