segunda-feira, 15 de outubro de 2012


 
 
 





Caríssimos amigos, irmãs e meus familiares
 

De volta ao ritmo de Timor Leste, já recuperada dessas diferenças climáticas e fuso horário e a cultivar a permanente motivação para continuar o percurso da missão, conjuntamente com a ir. Olívia e a ir. Lurdes, as aliadas e companheiras desta grande aventura que está longe de chegar à meta consumada. Apesar de alguma inação por falta de estruturas físicas e meios para iniciarmos um trabalho mais alicerçado num objetivo sonhado, já temos muitos passos dados.
A minha chegada a Maliana teve como primeira visita às Clarissas portuguesas de Monte Real que tinham chegado aqui no dia 13 de Setembro, uma visita coroada com um especial jantar na sua nova casa, transformado num mini-mosteiro. O jantar foi antecipado com a missa presidida pelo padre Hipólito, um jovem timorense que tem sempre uma atitude serena e contemplativa em tudo aquilo que partilha com as portuguesas. Em cada instante destes pequenos acontecimentos, sentimos que a unidade entre as pessoas é sempre uma grande vantagem, uma vantagem que nos faz ver que não estamos sós, neste mar de limitações e obstáculos que não cessam de nos bater à porta nas mais variadas maneiras.
E tudo se vai ajustando, até o desencaixotar dos muitos caixotes que eu própria tinha enviado de Portugal, porque afinal por 2,98 euros por cada 2kg de coisas, valeria a pena enviá-las para que, pelo menos o básico não nos falte, o que  me preocupa um pouco é que alguns que enviei em Agosto ainda não chegaram, mas irão chegar, tenho a certeza.
Fui revendo os lugares que rodeiam a residência a começar pelos vizinhos que se tornaram os nossos protetores e vigilantes quase noite e dia. A Amália, a bébé das fotos era uma recém-nascida em Junho, por pouco que nascia a caminho do hospital no jipe,  quando pelas 10 da noite transportámos a mãe. Seria o meu primeiro parto (pois também sou enfermeira), embora não tenha qualquer experiência desta assistência emergente naquela noite estava determinada a agir e relembrar essas noções que apreendi enquanto estudante de Enfermagem.
 Depois da visita a esta família, fomos percorrer a pé todo o território, agora transformado junto à ribeira fronteiriça.
A desilusão maior foi verificar o empasse da máquina do furo que se encontra no terreno da nossa futura residência desde agosto e agora quase a meados de Outubro continua sem grande evolução, porque,  segundo os técnicos, a broca fura e não sai porque encontra obstáculos nos 37 metros já furados. A máquina, cada dia sim, dia não, bloqueia e tem de ser arranjada e fica parada mais 24 horas. Enfim uma tensão que nos deixa quase desesperadas porque o tempo passa e de 2 em 2 dias acaba-se a água na rudimentar canalização da atual casa, onde habitamos. E  sem água, sem eletricidade durante muitas horas do dia como hoje, e em tantos empasses de espera, resta-nos esperar por aquele dia que irá acontecer e que vão cessar esses obstáculos básicos para que a coragem não falte.
Mas nem tudo é assim tão desolador. Temos o nosso Salão novo pronto a funcionar. Já iniciámos uma serie de atividades interessantes com o grupo de adolescentes a que demos o nome de “Grupo dos Pastorinhos de Fátima”. Todos os dias pelas 17,30  cerca de uma centena de crianças depois de terminar a escola vêm rezar o terço neste novo salão e bem se vê o entusiasmo deles por estarem num espaço físico novo sentados em cadeiras, que é outra oportunidade significativa, e ali rezam com o seu terço de plástico, objeto sagrado e amado por eles e que fazem questão de o trazer ao pescoço como se fosse um objeto da mais cara ourivesaria; sempre me impressionou isso.
A semana passada a ir. Olívia decidiu propor ao grupo dos Pastorinhos uma atividade de jardinagem, de casa cada um trouxe a sua flor e aqui as plantaram no espaço em redor do Salão, pelas fotos podem ter uma ideia de como foi interessante a reação deles.
Pensámos então em fazer o plano  de atividades para o grupo e na segunda-feira, ontem, a proposta foi fazer cada um, um desenho a exprimir o que gostam no grupo de Pastorinhos e assim desenvolver a sua imaginação. O curioso desta atividade que me surpreendeu imenso foi de fato a dificuldade que a maioria teve para esta aparente simples realização, depois de muito insistir cada um, a seu jeito e a medo, lá fez a obra-prima que agora está exposta no salão; alguns são realmente expressivos e até ternos.
 Não obstante estas pequenas centelhas da vida da missão, gostaria também de partilhar um pequeno episódio que me comoveu muito. Um dos nossos vizinhos anda a fazer a sua nova casa, aqui o espirito comunitário é um valor comum e bem definido entre a população, o problema mesmo é para além da falta de dinheiro e outras coisas básicas, não terem meios de transporte para acartar o material comprado para  a construção. Vieram-nos pedir para fazer esse frete em Maliana e lá fui eu, carregar o cimento, os ferros e outras coisas que de outra maneira não poderiam ser transportadas, para mim foi algo normal, sem grandes custos, sem qualquer dificuldade, mas quando cheguei ao lugar da construção o senhor, com tanta comoção, beijou-me as mãos a chorar agradecendo o favor, fiquei estupefata com tal atitude, já lá vão alguns dias e não me sai da cabeça tal gesto, embora já tenha ido de novo depois dessa vez buscar mais coisas para a dita construção pensei: “ao menos com este gesto de poder ter um carro posso ser útil a alguém e fazer a diferença em pequenos nadas para mim e que são tudo para os outros”.
O nosso dia termina sempre com um deslumbrante Pôr-do-sol que podemos ver descer em poucos minutos entre montanhas no horizonte que será nosso 24 sobre 24horas quando a nossa residência for habitada por nós.
E para os mais assustados/as e os mais corajosos/as apresento-vos finalmente um dos  residentes noturnos das paredes exteriores, a nossa pequena casa o Toky, de uma textura belíssima, este reptil sereno e original todas as noites afirma-se presente dizendo: “Tou aqui”, a medo lá o fotografei com o seu consentimento, desejo que o admirem.

E termino, um abraço e continuo a contar com o vosso apoio.

Tudo de bom para todos e todas vós.


Até breve.

 Ir Cristina

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