quarta-feira, 5 de dezembro de 2012



MOÇAMBIQUE COM CHEIRO

 
Quem nasceu em Moçambique e saiu do país, quem como estrangeiro viveu em Moçambique, quem fez alguma experiência em Moçambique como missionário (a), voluntário (a) ou mesmo profissional, parece que levou um novelo enorme com uma ponta que ficou em Moçambique e outra que está amarrada ao seu coração. Não fica satisfeito enquanto não vem à procura da ponta que ficou em Moçambique. Parece que este fio nunca se rompe, nunca se parte.
Moçambique tem íman, tem vida, tem cor, tem dança, tem cheiro, tem tempo, tem beleza. Dúvidas? Se não puderem vir cá, pelo menos leiam Mia Couto ou Paulina Chiziane.
Esta terra fascinante de 801.590 km2 com quase 24 milhões de pessoas, continua com algumas carências ao nível da saúde, da educação e da organização, embora tenha um governo legitimamente constituído que vai construindo as regras da democracia. Como noutras democracias, há partidos da oposição (Renamo acantonada na Gorongosa) e o MDM (Movimento Democrático de Moçambique) sediado na Beira.
Nesse sentido, nós, ALVD, temos estado a apoiar e a intervir no Niassa, na Zambézia, em Nampula.
A área da Província do Niassa tem praticamente 130.000 km2, com uma população a rondar os 2 milhões de pessoas, com a capital de Lichinga a albergar 145.000 pessoas.
A grande particularidade desta província é que é a maior província de Moçambique. Tem um bispo dehoniano. E quanto a nós, é a província mais pobre e menos desenvolvida. Por isso, estamos a fazer um esforço para intervir com projetos de desenvolvimento a partir dos leigos dehonianos.
A Zambézia é uma Província com uma área de 105.000 km2, com uma população de quatro milhões de pessoas. Tem por capital a cidade de Quelimane povoada de grandes palmeirais. Nesta província, pontificam as comunidades religiosas dehonianas. A primeira presença dehoniana em Moçambique começou nesta província, mais propriamente, no Alto Molócuè em 1947.
A Província de Nampula com uma área de 81.600 km2, é a província com mais população, ultrapassando os 4 milhões. A primeira capital de Moçambique situa-se nesta área, ou seja, na ilha de Moçambique. Aqui o arcebispo também é dehoniano, D. Tomé.
A presença dehoniana também está em Maputo (com 26.000 km2 e uma população de 1 milhão e meio de pessoas).
Isto sem esquecer a nova presença dehoniana, na Diocese da Beira, através do arcebispo D. Cláudio della Zuanna, ordenado a 7 de Outubro passado.
Como sempre, e em todas as sociedades, nem tudo é perfeito…
Fui engraxar os sapatos em Nampula que já tinham uma camada de pó acumulada durante dez dias. Estava um jovem forte a engraxar os seus. Esperei a minha vez ali na estrada, frente à Faculdade de Direito da UCM. Quando acabou, levantou-se e foi embora sem mais nem menos. Perguntei ao homem que estava a engraxar: ele não paga? É polícia. Por isso, não paga. Eu pensei talvez os protege dos ladrões. Quando terminou de engraxar os meus, perguntei quanto é que ele deveria pagar. Começou a rir, porque sabe que branco tem de pagar mais, porque branco é sinal de dinheiro. Lá lhe dei o dobro do que costumam receber ou seja, 20 meticais (50 cêntimos).
No entanto, enquanto engraxava, meti conversa com uns miúdos que estavam ali.
Disseram eles: Oh a vida deve ser cara em Lisboa. Nós aqui por dez meticais (20 cêntimos) comemos uma mão de xima (massa de milho cozida) e meio carapau e já é um bom almoço. Fiquei a pensar na alimentação deles…
Também fui ao famoso mercado que há ao domingo em Nampula. Fui com um padre moçambicano, pároco de Namarrói. Quando eu estava perto dele, os comerciantes pediam sempre o dobro do valor das coisas. Quando eu estava perto, a camisa custava 100 meticais. Quando eu me afastava, eles pediam só 50 meticais.
E para acabar … chegou o rapaz da rua que vende o jornal de notícias que custa 15 meticais. Dei-lhe uma nota de cinquenta meticais (um euro). Não tinha troco. Foi buscar o troco. Nunca mais apareceu. Três dias depois encontrei-o a vender o jornal da véspera (porque nunca há jornal do dia) e disse sem mais para me dar o jornal. Nem pestanejou. Ainda tenho crédito de 20 meticais. Dois dias depois encontrei-o noutro lado e deu-me mais um jornal. Ainda ficou com 5 meticais de crédito.
 Nem tudo é perfeito. É uma sociedade a aperfeiçoar-se, a desenvolver-se ao seu estilo. É um livro a ser escrito ao ritmo da pena do povo moçambicano. É a luta por uma vida melhor. Penso que Moçambique tem futuro, porque não tem perfume fabricado, mas tem o cheiro da vida, o fascínio da África.
  

Adérito Barbosa, scj

 

Maputo, Dezembro de 2012

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