segunda-feira, 5 de março de 2012

De Timor

Caríssimos amigos, familiares e queridas irmãs!
A vida por Timor Leste continua a ser real e sentida, e partilhar convosco é sempre um momento emocionante e quase sagrado, faz-me sentir mais próxima de cada um, sei também que todos vós vos sentireis um pouco mais próximos deste longínquo mundo no final da Asia.

Iniciámos a quaresma, para a maioria de nós um tempo de introspeção e reflexão que nos leva a compreender o verdadeiro sentido de sermos cristãos, filhos de Deus e irmãos em Cristo, é belo isto, é até uma ternura pensar que estamos nessa unidade, quer estejamos na Europa ou na Asia.
Há uma semana atrás, estive em Díli, como muitos de vós soubeste, periodicamente temos de lá ir, buscar mantimentos, tratar de alguns documentos, ver o correio que é só para lá que vai, e estar com a “nossa família adotiva”, os nossos padres jesuítas e a Mana Lina, com eles partilhamos as dificuldades, pedimos conselhos, questionamos e esclarecemos as nossas dúvidas, é mesmo, acreditem um momento familiar, um privilégio belíssimo!

 Para chegarmos a Díli fazemos uma longa viagem de 4horas e meia e desta vez foi um terrível dia inteiro. Saímos de casa pelas 7horas da manhã, todas satisfeitas e a pensar, lá vamos para a civilização, e a uns 20km da saída de Maliana, encontrámos a estrada cortada por uma montanha de lama que desceu e atulhou completamente a estrada fazendo a mesma desaparecer, bem eu abri os meus olhos incrédula com tal confusão naquela impossibilidade.

 Já lá andavam as maquinas a limpar, mas nunca imaginámos o desfeche daquilo, foram horas e horas de espera, à hora do almoço fomos comer qualquer coisa lá num cantinho e voltámos ao nosso lugar de espera, estávamos quase a desistir quando reparámos que estávamos encurraladas por carros e camiões por todo lado também para passar, resultado tivemos de esperar. Por volta das 6horas da tarde, começou a passar os primeiros carros, mas aquilo era mesmo um buraco de lama aberto, comecei logo a imaginar eu dentro do jipe a ficar lá enterrada, então decidi subir lá a um montezinho e ver o alcance daquela passagem e fiquei toda a tremer e pensei: não vamos conseguir sair daqui! E, entretanto chegou mesmo a nossa vez, as duas dentro do jipe a toda a força, tração às 4rodas e toca a encarar a realidade, bem na curva, o jipe não respondeu e aconteceu mesmo, ficámos presas na lama, mas como tínhamos uma multidão a observar, tudo foi possível com a ajuda de todos, eu claro saí do jipe, respirei fundo e pus os pés no chão ou melhor na lama até aos artelhos, com o apoio de dois timorenses consegui andar para terra seca e a ir.Olívia, a corajosa, ficou a dar conta do jipe com mais dois timorenses que em muito poucos minutos tiraram o jipe. Lá fomos e continuamos a nossa dura viagem até Díli, com os mais incríveis obstáculos: cabras no meio da estrada deitadas, que nos faziam o favor com muito má vontade de se levantarem para nós passarmos, vacas, cães, lagos de água com a acumulação das chuvas, noite escura porque já passava das 7horas da tarde, precipícios junto ao mar, montanha acima, montanha abaixo, mas chegámos pelas 11horas da noite sãs e salvas, graças a Deus! O nosso jesuíta, Pe. Martins costuma dizer-nos: rezem sempre o ato de contrição no inicio da viagem e no final agradeçam o ter chegado, e acreditem cumprimos. A emoção de cada instante faz-nos descarregar a adrenalina que temos acumulado ao longo de toda nossa vida! No dia seguinte ainda estávamos atordoadas com tal experiência!
Mas a estadia em Díli foi tranquila e muito bem aproveitada com tudo o que precisámos de fazer, ir à embaixada de Portugal é quase um ato obrigatório, assim como cumprimentar o senhor embaixador de Portugal que nos encontrou na rua, parou o carro e questionou dizendo: mas o que andam aqui a fazer em Díli? Quase que nem o conhecíamos com esta abordagem tão próxima! Era carnaval e aproveitámos para dar uma volta a pé enquanto esperámos que a oficina nos lavasse o jipe porque tinha tanta lama que até andava mal.
A nossa visita por Díli desta vez teve uma dimensão mais densa, decidimos percorrer a baía de Díli até à praia de Cristo Rei, fiquei completamente extasiada com aquela beleza, aquele longínquo mar indico donde podíamos ver a chamada Ilha de Timor, com um belíssimo berço para as nuvens que nela pousavam.

 No outro lado bem lá no alto, estava Ele, o Cristo, o Rei, que como em Almada está de braços abertos para o Mar, comovente, tocante e profundamente espiritual todo aquele percurso que palmilhámos, o coração quase que não me cabia dentro do peito, o esforço que fiz para não gritar por Cristo ao vê-lo naquele monte tão alto e tão estratégico em termos de lugar!
Descemos á praia e brincámos um pouco com duas crianças que assim que nos viram, gritavam: tira foto, tira foto!



 A ir.Olívia dizia também encantada com o percurso: “aqui vê-se e sente-se que andou por aqui Deus, já vista a cor das águas e o verde das montanhas?” De facto aquele dia foi diferente, não só por aquele percurso mas também pelos acontecimentos que foram surgindo milagrosamente naquela tarde, que não irei falar deles agora, mais lá para a frente…noutra partilha! Este era também o primeiro dia da quaresma!

No dia seguinte regressámos a Maliana, e continuámos a deslumbrar a beleza do que envolve a ilha de Timor e, bem no final da travessia junto ao Mar, deparámo-nos com a curiosa divisão entre os dois mares, Indico e pacífico, esta divisão podem vê-la nas suas duas cores de azul no horizonte, muito bonito mesmo!

 Termino por agora, desejando-vos muita alegria e saúde e que a chuva vos visite em Portugal, aqui quando vem temos sempre a sorte de ficar com uma lagoa natural em frente à porta de casa!
São bênçãos!

 Um abraço amigo…

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